quinta-feira, 20 de novembro de 2008

VII CONGRESSO IBÉRICO “A BICICLETA E A CIDADE” EM PROL DA EMANCIPAÇÃO DA BICICLETA

Realizou-se em Vilamoura, nos passados dias 1 e 2 de Novembro, a Sétima Edição do Congresso Ibérico “A Bicicleta e a Cidade”.Foi a vez de Portugal e do Algarve receberem este evento e a primeira nota é, precisamente, para destacar a hospitalidade com que o município de Loulé e a freguesia de Quarteira, em particular, souberam receber os participantes portugueses e espanhóis.Estes congressos são organizados bienalmente, alternadamente num e noutro lado da fronteira, procurando trocar experiências, apontar boas práticas e definir estratégias comuns para a promoção da bicicleta numa perspectiva de promoção deste meio de mobilidade suave em ambos os estados ibéricos.Na verdade passaram quase uma quinzena de anos desde a realização do primeiro Congresso Ibérico dedicado ao tema da Bicicleta e a Cidade e que teve lugar em Lisboa em 1996, promovido pela Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB) e pela Coordenadora em Defensa de la Bici (ConBici). Ambas as instituições agem, nos respectivos países, como lobbistas da causa velocipédica.A primeira constatação, ao jeito de conclusão, é que se reconhece uma evolução da situação da bicicleta em ambos os países, com maior ênfase em Espanha e que a bicicleta voltou a ocupar o seu lugar nas políticas e nas cidades embora, realisticamente se entenda que ainda há muito para fazer. Contudo existem, já hoje, muitos e bons exemplos de criação de infra-estruturas propiciadoras da utilização da bicicleta, soluções de parqueamento, de transporte de velocípedes nos transportes colectivos de passageiros, etc.Das intervenções produzidas, todas elas de enorme interesse, gostaríamos de salientar algumas.O DIREITO À ACESSIBILIDADEJosé Limão que referiu que o direito à acessibilidade deve ser reconhecido, em cada país, através das formas mais adequadas sugerindo mesmo a sua inscrição no texto constitucional como um direito dos cidadãos a par com a educação, a saúde ou a justiça já que o direito de acessibilidade se revela, hoje, tão vital à liberdade individual e colectiva, como os já constitucionalmente consagrados.As formas de mobilidade suave, como é o caso da deslocação em bicicleta, fazem parte deste novo paradigma e devem ser integradas nas políticas e sistemas de transportes tal como já acontece hoje em alguns países do norte da Europa onde é encarada como um veículo imprescindível à mobilidade.NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DO CÓDIGO DA ESTRADA PORTUGUÊSAs intervenções de Pedro Roque da FPCUB (também autor destas linhas) e de Mário Alves, engenheiro especialista em transportes, coincidiram na necessidade gritante de alteração do Código da Estrada (CE) português com o intuito de que o mesmo, no que aos modos suaves de mobilidade, em geral, e à bicicleta, em particular diz respeito possa ser convergente com as legislações congéneres dos outros estados-membro da UE. Apontou-se até, o caso do CE espanhol, país com o qual as afinidades culturais são mais que óbvias, como um exemplo a seguir nesse caminho urgente de revisão, tendo sido anunciado a iniciativa de promoção de uma petição à Assembleia da República nesse sentido, promovida pela FPCUB.É entendido que a CE deve seguir novo paradigma que aponte no sentido da legislação hierarquizar a protecção dos utentes da via pública de acordo com o seu grau de fragilidade: peões, bicicletas, motociclos, automóveis ligeiros e pesados.Apontou-se, também, para a necessidade de promoção da mobilidade em bicicleta, por parte dos poderes públicos, assegurando as condições legais e infraestruturais para esse desiderato de mobilidade garantindo a segurança daqueles que optarem pelas formas de mobilidade suave. São exemplos de boas práticas internacionais a serem implementadas em Portugal a redução da velocidade do automóveis pela aplicação de diversas medidas de acalmia de tráfego como sejam a fiscalização da obrigatoriedade do cumprimento rigoroso dos limites de velocidade, a criação de zonas 30 nos centros urbanos e de zonas de partilha de circulação.BALANÇO DOS CONGRESSOS IBÉRICOS E REALIDADE ACTUAL DO CICLISMO URBANO EM ESPANHAJoaquín Vilas, em representação da associação La Coruña en Bici, efectuou um paralelo entre as diferentes edições do Congresso Ibérico e a evolução do ciclismo urbano em Espanha. Apontou como soluções que conduzam à evolução da mobilidade em bicicleta, seja em Espanha, seja em Portugal, os sistemas de bicicletas de utilização pública situados em pontos estratégicos das cidades (interfaces de transportes, junto a parques de estacionamento dissuasores, por exemplo) com os objectivos do uso eficiente do espaço público e como forma de intermodalidade e economia de tempo, de espaço e de custos. Apontou como exemplos a seguir os sistemas de Gijón, Barcelona, Sevilha, Vitória, ou Barcelona.A acalmia de tráfego deve ser prioritária evitando-se, sempre que possível a segregação dos utilizadores de bicicleta. Estes devem circular em faixas cicláveis e em zonas 30 onde deve haver lugar à circulação partilhada. A implementação de ciclovias (segregação) deve ser feita apenas onde não for possível reduzir a velocidade de circulação dos veículos. É mais fácil e mais barato reduzir a velocidade dos veículos em circulação até níveis em que a partilha com as bicicletas seja segura do que investir em ciclovias.Referiu que, em Espanha, há mais de 1700 km de antigos traçados ferroviários convertidos em Vias Verdes, para peões e ciclistas que serão acrescentados em mais quilómetros (Ecovias da REFER, em Portugal). Além disso existem os Caminhos de Santiago com 2.000 km de vias percorridas por peregrinos a pé e ciclo-peregrinos, sem tráfego automóvel. Ainda não adaptados existem também os chamados caminhos da transumância, bem como os caminhos de sirga dos canais fluviais uns e outros que também se pensam adaptar para ciclistas.No referente à relação entre a bicicleta e o transporte colectivo reconhecem-se nas duas nações ibéricas claros avanços em relação ao transporte das bicicletas no metropolitano, tram-train e comboios, especialmente nos subúrbios das cidades. No entanto há problemas nos comboios de longa distância pelo que se exige que também a esse nível passe a ser autorizado e facilitado o transporte da bicicleta.É urgente resolver as falhas na sinalização em rotas frequentadas por ciclistas, sobretudo aos fins-de-semana, avisando os automobilistas de que se podem encontrar com um grupo de ciclistas em circulação.Os utilizadores de bicicleta estão preocupados com as repercussões da tendência em toda a Europa de obrigatoriedade da iluminação de veículos automóveis durante todas as horas do dia. Os ciclistas sairão prejudicados porque acabam por ficar mais desprotegidos dado que mesmo que circulem com luzes acesas nas bicicletas a sua intensidade é menor e ficarão menos visíveis no meio do trânsito.Os municípios deveriam instituir, por norma, que sempre que haja uma obra devem aproveitar para deixar espaço ou fazer alterações que beneficiem a utilização da bicicleta ou que pelo menos não a compliquem, como a questão da colocação de sarjetas, colocação de postes de iluminação e sinalização vertical que roubam espaço e visibilidade à circulação, etc.Em relação ao estacionamento a questão continua a ser a mesma. Escolhem-se, por vezes, modelos inúteis e inseguros (que prendem a bicicleta apenas por uma roda e viabilizam o seu roubo) simplesmente porque quem projecta e implementa não tem a visão do utilizador de bicicleta nem da realidade.Idealmente, as bicicletas devem poder passar a pernoitar na rua a exemplo dos automóveis, mas para isso é necessário garantir a sua segurança.

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